terça-feira, 9 de outubro de 2012

Vagabundos Iluminados


Aí vai alguns trechos da entrevista do Claudio Willer para Correio Brasiliense em 29/9/2012.

Quem são os precursores reconhecidos ou não da literatura beat? Walt Whitman? Jean-Arthur Rimbaud? Baudelaire? Louis Ferdinand Céline?

E William Blake. Mas ele e outros autores que você cita – Whitman, Rimbaud, Baudelaire – são universais. Influenciaram tudo, a beat e o restante. É forte a influência dos românticos – Gregory Corso idolatrava Shelly, fez que o enterrasse em Roma ao lado do túmulo do poeta inglês. E de formalistas: Ezra Pound e dois de seus seguidores, William Carlos William, mentor de Ginsberg, e Charles Olson, cultuado por Michael McClure. E muito mais. Kerouac e amigos faziam leituras em voz alta de Ulisses e Finnegan’s Wake de James Joyce, para captar a prosódia. Viajavam com um volume de Proust, como foi mostrado no filme de Walter Salles, Na Estrada.

Há uma leitura talvez rasa segundo a qual os autores da literatura beat eram pouco letrados. Isso procede?

Basta lê-los! O tempo todo comentam suas leituras. Kerouac, nos diários e em Anjos da desolação: “Histórias de dor! De repente estou escrevendo como Céline”. Etc. Mais importante que os comentários é o intertexto: reescreveram e recriaram o que leram. Em todos eles, constantemente, se observa o diálogo criativo com outros autores.

Parece que Charles Bukowski não gostava de ser ligado à literatura beat. Como avalia as relações dele com o movimento?

Bukowski reconheceu a importância de Ginsberg, e da beat em geral, em Pedaços de um caderno manchado de vinho. Mas, naquela altura, os beats eram celebridades, e Bukowski fazia questão de ser a margem da margem, o rebelde perante a rebelião. Beat, já convertida em beatniks e em contracultura, era algo coletivo demais para ele, individualista radical: “Eu era um movimento de protesto, sozinho”, escreveu. Ademais, religiosidade e misticismo, fortes em Ginsberg, Kerouac ou Snyder, eram algo ausente de seu interesse ou sensibilidade.

Pra fechar! Um trecho do poema Uivo de Allen Ginsberg traduzido pelo Claudio Willer também.

"Eu vi os expoentes da minha geração destruídos pela loucura, morrendo de fome, histéricos, nus,
Arrastando-se pelas ruas do bairro negro de madrugada em busca de uma dose violenta de qualquer coisa,
“hipsters” com cabeça de anjo ansiando pelo antigo contato celestial com o dínamo estrelado da maquinaria da noite,
Que pobres, esfarrapados e olheiras fundas, viajaram fumando sentados na sobrenatural escuridão dos miseráveis apartamentos sem água quente, flutuando sobre os tetos das cidades contemplando jazz,
Que desnudaram seus cérebros ao céu sob Elevado e viram anjos maometanos cambaleando iluminados nos telhados das casas de cômodos,
Que passaram por universidades com olhos frios e radiantes alucinando Arkansas e tragédias à luz de Blake entre os estudiosos da guerra,
Que foram expulsos das universidades por serem loucos & publicarem odes obscenas nas janelas do crânio,
Que se refugiaram em quartos de parede de pintura descascada sem roupa de baixo queimando seu dinheiro em cestos de papel, escutando o Terror através da parede".

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